Os Ultras são o mal do futebol e devem ser parados. É a reação da opinião pública diante dos conflitos que ocorrem entre torcedores, que reabrem o debate sobre o “tifo” violento. Reencontrar toda a violência do futebol em grupos organizados, além de ser uma leitura superficial do que aconteceu, significa contar apenas uma parte dessa história. Até porque, desde suas origens, o futebol teve que lidar com os torcedores violentos.
Você já ouviu falar do “Scudetto delle pistole”? Talvez você não saiba, mas em 1925 houve conflitos entre os torcedores de Bologna e de Genoa na Estação Porta Nuova de Torino, que se transformou em um verdadeiro tiroteio, e na época os Ultras não existiam. Como nasceu então o fenômeno da torcida organizada? Mas, sobretudo, quem são os Ultras? Vamos começar pelo significado da palavra. O que significa Ultras? Se procurarmos no dicionário, encontramos a palavra Ultra que é a outra forma com que se refere ao tipo organizado. O termo “Ultra” deriva do francês, da abreviação de ultra-royaliste, ou seja, ultrarrealista, que estava a indicar os mais realistas do rei, ou seja, os apoiadores da monarquia, nos tempos da segunda restauração. O termo, com o tempo, se estendeu não só ao esporte, mas também à política, se tornando sinônimo de extremista ou apoiador fanático.
Mas voltamos aos nossos dias. Quando nasceram os movimentos Ultras, as primeiras agregações espontâneas de fãs se formaram nos anos 50. O objetivo era o de torcer para a sua própria equipe do coração, não só em casa, mas também em viagem.
Já na época, os fãs organizavam viagens em ocasiões de viagens mais importantes e organizavam as primeiras formas de coreografia. Difícil dizer com certeza, mas, qual foi o primeiro verdadeiro grupo Ultras nascido na Itália. No entanto, há uma data que simbolicamente marca o nascimento do torcedor organizado, assim como conhecemos hoje, em 1968. Os anos 60 representaram para a Itália um período de grandes transformações, encarnados no espírito revolucionário de 1968 e contraditório dos primeiros movimentos de massa. Os anos em que a nova geração se rebelava às regras impostas pela sociedade e queria fazer sentir a sua voz. É nesse contexto que nasceram os primeiros grupos Ultras, que, na falsa linha dos partidos políticos e dos movimentos estudantes da época, representavam uma forma de agregação para os mais jovens. As novas gerações ocupavam os setores mais populares dos estádios, as curvas, procurando a visibilidade que não encontravam na vida de todos os dias. O estádio servia como um megafone para essas pulsões juvenis. Com os Ultras mudou o modo de torcer para a própria equipe do coração. Foram os Ultras a introduzirem para os estádios as bandeiras e criar suas próprias coreografias, assim como os primeiros coros acompanhados por trombas e tambores. Esses novos ultra - torcedores se distinguiam não só pelo jeito de se fazer, mas também pela vestimenta. Eles vestiam camisas, chapéus e faixas com os cores da própria equipe do coração, símbolos de pertencimento e de identidade, para mostrar também fora do estádio. Era a grande novidade, além da força atrativa do fenômeno Ultras, agregar milhares de pessoas sob uma única fé no futebol.
Os próximos anos 80 significaram o boom do torcedor organizado e o fenômeno Ultras, que era nascido nas grandes metrópoles italianas, bem rápido se alargou também nas cidades de província, da Série A à Série C. Não havia uma única equipe de futebol que não tivesse pelo menos um grupo de torcedores organizados ao seu redor. Anos que foram marcado, porém, também por conflitos violentos entre torcedores opostos. A formação de novos grupos Ultras acompanhava o surgimento de rivalidades cada vez mais intensas/ferozes. Se originalmente o torcedor era um instrumento para ajudar sua própria equipe a vencer, os Ultras deveriam ser o 12º homem no campo. Não demorou para se tornar um meio de se impor sobre os torcedores rivais. Uma batalha que se consumava com os sons de coreografia, mas também de combates físicos. Esclareçamos desde já que um código Ultras não existe, no sentido de que não existem regras escritas, mas sim o que poderíamos definir como uma ética, que regula o mundo das torcidas organizadas. Por exemplo, na lógica Ultras é proibido envolver pessoas estranhas, Se ocorrerem confrontos, devem envolver apenas os ultras e não devem ser usadas armas. Mas sabemos bem que nem sempre este Código de Honra foi respeitado. A violência fora de controle, infelizmente, foi uma das principais causas da crise do fenômeno Ultras nos anos 90, com o deslizamento de diversos grupos históricos, frequentemente associados ao mundo da criminalidade. O ponto alto desta crise ocorreu em 1995, quando, antes de Genoa-Milan, perdeu a vida Vincenzo Spagnolo, fã genoano que foi morto por um ultra-milanista. Um episódio que incomodou a opinião pública e que levou o Estado a introduzir, ao longo dos anos, medidas para contrastar o torcedor violento, como o DASPO (uma espécie de proibição de frequentar eventos esportivos) e a la tessera del tifoso (carteira de torcedor) (um documento de identificação para frequentadores de estádios).
Frequentemente, justamente a respeito da torcida violenta, se disse que a Itália deveria copiar o que o Reino Unido fez para conter o fenômeno dos hooligans. Antes de se tornar o campeonato mais assistido do mundo, de fato, a Premier League teve que lidar com a violência nos estádios. A mídia criou muita confusão a respeito, comparando os Ultras aos hooligans, dois fenômenos semelhantes, mas em muitos aspectos diferentes entre si. Primeiramente, os hooligans não possuem uma estrutura hierárquica como a dos Ultras, falta aquela cultura idêntica. Mas, sobretudo, os grupos Ultras abraçam todas as classes da sociedade civil. O movimento Ultras é, pela sua natureza, interclassista, no sentido de que, na curva, você pode encontrar o filho do trabalhador ao lado do filho de um médico, enquanto o fenômeno dos hooligans é representado, pelo menos, pela classe trabalhadora, ou seja, a classe trabalhadora. mas sobretudo os grupos Ultras abrangem todas as classes da sociedade civil. O movimento Ultras é por sua natureza interclassista, no sentido de que na arquibancada se pode encontrar o filho do operário ao lado do filho de um médico, enquanto o fenômeno dos hooligans é representado principalmente pela working class, ou seja, a classe operária. Não é por acaso, de fato, se o fenômeno da torcida violenta na Inglaterra se reduziu também graças ao preço alto dos ingressos, que praticamente excluiu os hooligans dos estádios. Santos ou criminosos, apaixonados ou fanáticos, bons ou maus.
Quem são realmente os Ultras?
Há quem continue a ver esses torcedores como um perigo e quem, por outro lado, os veja como a representação da verdadeira torcida de estádio? Seja qual for a sua opinião, esperamos tê-lo(a) feito conhecer algo mais sobre o mundo Ultras, um fenômeno muito mais complexo do que a mídia e a imprensa têm contado nesses anos e que, para o bem e para o mal, continuará a ser um dos protagonistas do nosso futebol.
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